O Brasil é um país de desigualdades extremas. Ao mesmo tempo em que somos uma das maiores economias do mundo – em termos de Produto Interno Bruto – faltam recursos para investir em educação, saneamento, moradia e outros setores que poderiam elevar o nível de vida de toda a população.
QUINTA-FEIRA, 13 DE FEVEREIRO DE 2025
O Brasil é um país de desigualdades extremas. Ao mesmo tempo em que somos uma das maiores economias do mundo – em termos de Produto Interno Bruto – faltam recursos para investir em educação, saneamento, moradia e outros setores que poderiam elevar o nível de vida de toda a população.
Somos pobres e ricos e grande parte desse problema decorre de um nível elevado de corrupção e desperdício de dinheiro público, o que faz com que seja extremamente necessário atuar de perto para coibir a improbidade administrativa.
Com esse espírito foi promulgada a Lei 8.429/92, a chamada Lei de Improbidade Administrativa.
Durante quase três décadas essa lei vigorou sem grandes alterações e, nesse período, intensificou-se bastante a atuação para punir agentes públicos que praticassem atos de improbidade. Sem dúvida houve bastante avanço no combate à improbidade desde a promulgação da Lei de Improbidade Administrativa.
Mas a lei 8.429/92 era severa ao extremo. Seu texto original continha termos muito amplos, permitia interpretações elásticas, e, com isso, gerou enorme insegurança para a atuação de agentes públicos probos.
Qualquer deslize em uma contratação ou pagamento de quantia pública poderia ensejar uma ação de improbidade administrativa e, com o passar dos anos, tornou-se senso comum (ao menos entre a classe dos advogados) que era necessário remodelar a lei de improbidade administrativa.
O Congresso Nacional promulgou, então, a lei n. 14.230/21, que trouxe algumas alterações profundas na disciplina da improbidade administrativa.
Questões técnicas como a regulação da prescrição ou dos requisitos para decretação da indisponibilidade de bens do réu antes da sua oitiva receberam tratamento detalhado pela nova lei, eliminando lacunas e dissipando dúvidas que alimentavam inúmeros recursos dirigidos aos mais diversos Tribunais do país.
Mas o maior avanço, sem dúvida, encontra-se na alteração dos artigos 9º, 10 e 11 da Lei de Improbidade Administrativa, caracterizando como ato de improbidade administrativa apenas a ação ou omissão dolosa que (i) permita auferir vantagem patrimonial indevida (art. 9º); (ii) cause lesão ao erário (art. 10); ou, (iii) viole os deveres de honestidade, imparcialidade e legalidade caracterizada pelas condutas descritas nos incisos do art. 11.
Não há mais dúvida de que a improbidade tem que ser um ato doloso. O agente público que erra por culpa não é um agente ímprobo e não pode ser comparado ou colocado no mesmo rótulo daquele que age com dolo.
Isso faz com que os cidadãos de bem, interessados em atuar na administração da coisa pública, possam ter mais tranquilidade no seu dia a dia. Não precisam temer que qualquer deslize venha a ocasionar uma grave condenação por ato de improbidade, causando-lhe sérios prejuízos em todas as esferas, mas sobretudo em sua reputação.
Mas, se o temor de sofrer uma condenação por ato de improbidade pode ter arrefecido em função das alterações legislativas, o mesmo não pode ser dito do receio de ter que responder a um processo de improbidade administrativa.
A lei de improbidade administrativa continua sem um dispositivo que preveja a condenação em qualquer hipótese em honorários de sucumbência e isso, do ponto de vista da lógica econômica, é um incentivo muito grande à litigância irresponsável.
É verdade que o art. 23-B, § 2º, incluído pela Lei n. 14.230/21 prevê a condenação em honorários em caso de improcedência, mas o faz apenas se houver comprovada má-fé, o que, na prática, é muito raro de acontecer. Essa excessiva limitação à condenação em honorários de sucumbência acaba fazendo com que o risco de condenação para o autor da ação seja mínimo.
Ao permitir que o Ministério Público proponha uma ação de improbidade administrativa sem assumir plenamente o risco da sua atuação, a lei acaba desincentivando o cuidado na averiguação prévia da existência de indícios concretos que permitam a propositura da ação de improbidade.
Se não há risco concreto de sucumbência, fica muito mais fácil incluir agentes públicos na demanda e deixar para o Judiciário analisar o caso futuramente.
Na dúvida, permite-se que todos sejam incluídos como réus e deixa-se o trabalho de averiguação da existência concreta de atos de improbidade para a fase de instrução processual, já que até mesmo o reconhecimento do não preenchimento dos requisitos para a propositura da ação previstos no art. 17, § 6º, da lei 8.429/92, acaba sendo mitigado pela aplicação exagerada do princípio in dubio pro societatis nas ações de improbidade.
Esse cenário gera incerteza e causa enormes prejuízos aos agentes probos que acabam tendo que se defender em ações de improbidade mal propostas, afastando, muitas vezes, pessoas de bem do trato com a coisa pública.
Essa não pode ser a lógica do sistema. O Ministério Público dispõe de amplos meios instrutórios para preparar previamente suas ações de improbidade. É necessário que essa atuação seja bastante cuidadosa, porque não é interesse da sociedade retirar dos bons agentes o interesse em atuar na administração pública.
O risco do processo na ação de improbidade administrativa tem múltiplas funções, e não deve ser assumido apenas em casos de comprovada má-fé.
Ele pode evitar a proliferação de demandas infundadas e, com isso, dificultar a perseguição política e diminuir o risco de ser um administrador público. Do ponto de vista estritamente processual, ele é essencial para preservar um ambiente équo de litígio e fazer com que as partes se responsabilizem pela sua atuação em juízo. Com isso, cria-se um ambiente que diminui não só o número de processos dirigidos desnecessariamente ao Judiciário, mas também o número de recursos que seriam interpostos por agentes públicos que não deveriam ser partes nas demandas, o que, ao fim e ao cabo, acaba gerando uma saudável economia de recursos públicos.
É necessário, portanto, rever a limitação da condenação em honorários advocatícios nas ações de improbidade. A parte que der causa à propositura de uma ação de improbidade – em qualquer hipótese – deve ser condenada a pagar honorários à outra parte, a fim de impedir a possibilidade de haver um litígio tão relevante com risco mínimo.
Está aí uma bandeira que a OAB deve continuar a hastear, até que o legislador se convença da necessidade de aprimorar, também nesse aspecto, a legislação sobre improbidade administrativa.
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