A dose certa de um remédio pode curar e a dose excessiva pode causar mal. É por isso que comumente se fala que a diferença entre o remédio e o veneno está na dose.

Esse parece ser o problema que envolve as sustentações orais nas sessões de julgamento nos nossos mais diversos tribunais.

Vamos falar sobre as
sustentações orais?

QUINTA-FEIRA, 13 DE FEVEREIRO DE 2025 

A dose certa de um remédio pode curar e a dose excessiva pode causar mal. É por isso que comumente se fala que a diferença entre o remédio e o veneno está na dose.

Esse parece ser o problema que envolve as sustentações orais nas sessões de julgamento nos nossos mais diversos tribunais. Quem atua na advocacia contenciosa, ou acompanha o cotidiano das nossas cortes, tem percebido que cada vez mais existem magistrados que demonstram um desconforto com o número excessivo de sustentações orais que são feitas pelos advogados.

Essas reações muitas vezes extrapolam o limite da legalidade estrita e geram problemas para a segurança jurídica e o pleno exercício do direito de defesa. Para ilustrar o problema, temos reações como a presunção de intimação do acórdão em razão de ter o advogado feito sustentação oral e escutado o voto na sessão de julgamento, ou o indeferimento do pedido de realização de sustentação oral a partir de interpretações demasiadamente elásticas do texto legal.

Sempre que uma dessas situações ocorre, a classe dos advogados demonstra preocupação e inconformismo, no que está coberta de razão. É necessário que haja segurança jurídica para o bom desempenho da advocacia, e, para tanto, não se pode criar soluções não previstas em lei para limitar o exercício de um direito assegurado em lei.

Mas a solução do problema exige uma análise um pouco mais cuidadosa. O Judiciário está demonstrando que não tem mais condições de suportar o número excessivo de sustentações orais que vem sendo realizado. O remédio está se tornando veneno, porque os julgadores perdem a capacidade de se concentrar em tudo o que está sendo dito. As longas horas de sessões de julgamento impedem que a pauta seja organizada de maneira eficiente. A exaustão das sessões compromete a disposição para o debate sobre questões importantes entre os membros das sessões colegiadas. O resultado prejudica a todos.

O problema está colocado e não deve ser encarado unicamente a partir dos excessos cometidos por alguns magistrados. Para que não me compreendam mal, esses excessos devem ser combatidos, porque ofendem a segurança jurídica, mas, é importante observar que esses excessos são consequência e não a causa dessa crise que envolve as sustentações orais nos tribunais.

A causa, sem dúvida é o uso excessivo dessa ferramenta, que aumenta a cada dia em função de vários fatores, que vão, desde a facilidade para sua realização (aumentada com a instituição de julgamentos em sessão telepresencial), passando pela dificuldade que muitas vezes o advogado encontra para despachar memorial com os julgadores, e até mesmo pelo receio de que se não for feita a sustentação oral, o julgamento colegiado não se realizará em sua plenitude.

Quando se percebe que a causa desse problema está no elevadíssimo número de sustentações orais que vem sendo realizado, a resposta parece ser clara: é necessário limitar o uso desse instrumento. Mas, a forma como essa limitação deve ser feita exige um debate mais amplo. O que deve ser limitado, o tempo das sustentações orais? A matéria em discussão, especialmente se já há ou não julgamento vinculante sobre o tema? Pode-se pensar em impor um pedido fundamentado para justificar a necessidade de realização, o que poderia ser justificado até pelo fato de o advogado não ter sido recebido pelo magistrado para despachar memorial.

A melhor forma de limitar o uso das sustentações orais ainda não tem uma resposta pronta, o que deverá vir apenas com um debate mais amplo sobre esse problema.

Para que esse debate se inicie é necessário que a advocacia reconheça que o remédio se tornou veneno e não queira apenas lutar para manter a regra do jogo, que permite o uso bastante amplificado das sustentações orais.

É do interesse da advocacia a excelência na prestação do serviço jurisdicional e, para tanto, devemos estar atentos para as limitações práticas e de recursos do Poder Judiciário.

Devemos combater os excessos e abusos que vêm sendo praticados em contrariedade àquilo que a lei prevê, mas não podemos fechar os olhos para a causa desse problema. Espera-se, assim, que advogados, juízes e promotores busquem uma solução conjunta que permita o uso mais racional dessa importante ferramenta de defesa.